Unindo literatura, cinema e gastronomia, a professora Suellen de Andrade, do curso de Gastronomia do CES, reflete sobre a relação das pessoas com a comida. As observações foram feitas com base no filme dinamarquês "A festa de Babette" (1987), do diretor Grabriel Axel. No filme, ambientado no século 19, em um vilarejo da Dinamarca, duas filhas de um pastor contratam uma parisiense recém-chegada como cozinheira. Anos depois, elas decidem comemorar o centenário de nascimento do pastor e a cozinheira lhes oferece um banquete inesquecível.
Leia a crônica de autoria da professora e, ao fim, confira a receita de Baba ao Rum, reproduzida pelos alunos do 3º período de Gastronomia, na disciplina de Pâtisserie.
A razão para as coisas
Suellen Dias de Andrade
Das cenas de cinema que me encantam, há uma em que eu gostaria de estar presente: a do jantar em comemoração ao centenário de nascimento do pastor em A Festa de Babette. Banquete francês com requinte de detalhes, desde a mesa posta às iguarias servidas. Pratos, talheres, taças, guardanapos, velas. Posso até sentir o cheiro, o sabor, a textura de cada alimento degustado, do Baba ao Rum servido de sobremesa e do champagne harmonizado.
Mas, certamente, se eu estivesse lá, não estaria sentada à mesa ao lado dos convidados de Martine e Felippa. Ah, eu estaria lá na cozinha, ao lado de Babette, no preparo da ceia. Ou até mesmo no posto do menino Eric, servindo os comensais. Porque, depois de tempos e algumas experiências, me dei conta do valor que tem, para mim, cozinhar e servir as pessoas. Trata-se de uma paixão dessas que vêm por si só, sem grandes justificativas. Mas que dão novo rumo e definem a vida da gente.
Outrora grande chef de um restaurante parisiense, Babette, interpretada pela atriz francesa Stéphane Audran, era criada de duas irmãs em um vilarejo na costa da Dinamarca. Chegou lá fugindo da guerra civil de seu país, depois de perder tudo o que tinha, inclusive marido e filho. Recomeçou sua história, e através de sua comida, a personagem ressignificou as relações entre os moradores locais.
O clímax alcançou com ‘sua festa’, o jantar servido em honra ao pastor, onde a magia da cozinha aconteceu. Nas palavras do escritor Rubem Alves, “a feitiçaria aconteceu: sopa de tartaruga, cailles au sarcophage, vinhos maravilhosos, o prazer amaciando os sentimentos e pensamentos, as durezas e rugas do corpo sendo alisadas pelo paladar, as máscaras caindo, os rostos endurecidos ficando bonitos pelo riso”.
Os convidados não permaneceram os mesmos, pois a comida muda as pessoas. Babette mudou o próprio destino através dela. Fez sua paixão pela culinária dar sentido a uma vida sofrida e já vazia. Para além das telas, eu também conheço um tanto de gente que fez e faz da cozinha um recurso de transformação, uma ferramenta de busca, crescimento e existência. Incluindo eu. Salve!
Baba ao rum
Bolo tradicional francês
Para a massa:
250 g de farinha de trigo – 15g de fermento biológico – 60 ml de leite – 40 g de açúcar – 2 ovos – 1 pitada de sal – 75 g de manteiga sem sal – Raspas de 1/2 laranja
Para a calda:
120 ml de água – 250 g de açúcar – 1 tira de casca de laranja – 1 canela em rama pequena – 30 ml de rum
Finalização:
100g de creme de leite – 50g de morango
Em uma tigela, coloque 60 g da farinha de trigo, junte o fermento e o leite, aos poucos, e misture (na culinária, damos o nome de esponja a esse preparo). Cubra a mistura com um pano de prato ou filme de PVC e deixe fermentar por 30 minutos.
Passado o período de fermentação, em uma outra tigela, misture o restante da farinha, os ovos e o açúcar, e acrescente a esponja. Adicione uma pitada de sal e, por último, junte a manteiga em temperatura ambiente, as raspas de laranja. Mexa tudo e deixe repousar por mais 30 minutos.
Despeje a massa em forminhas de buraco no meio untadas e enfarinhadas. Mais uma vez, deixe a massa descansar até dobrar de volume. Em seguida, leve ao forno preaquecido a 150°C até dourar. Retire do forno e deixe esfriar.
Para preparar a calda, leve ao fogo a água, o açúcar, a casca de laranja e a canela. Depois que a mistura ferver, junte o rum. Retire a casaca da laranja e o pau de canela e despeje a calda quente sobre o bolo frio, ainda na fôrma. Deixe esfriar e desenforme ainda morno. Reserve.
Na batedeira, bata a creme de leite bem gelado até obter o ponto de chantilly. Servir junto aos morangos como acompanhamento para o baba ao rum.